Usado por escassos minutos, mas com um tempo de vida quase eterno – o plástico de uso único tornou-se num dos maiores flagelos do nosso planeta. Actualmente, produzem-se a nível global cerca de 300 milhões de toneladas de plástico por ano, sendo cerca da sua metade concebida para ser usada apenas uma vez.
Palhinhas, garrafas, sacos e embalagens de comida de plástico estão tão enraizados nas nossas vidas diárias que muitas vezes se torna difícil evitá-los. O plástico de uso único é, infelizmente, parte integrante do nosso quotidiano.
Mas nem sempre foi assim.
A era dos plásticos modernos tem pouco mais de um século, tendo nascido em 1909 quando Leo Baekeland, um químico belga, inventou a baquelite, o 1º plástico sintético que não derivava de plantas ou animais, mas sim de combustíveis fósseis. Leve, resistente e durável, a baquelite podia ser moldada em formatos quase infinitos e foi este vasto potencial que levou à rápida expansão do seu uso e fabrico. Foi, também, nesta altura que surgiu o plástico descartável que, e de acordo com a legislação americana de então, devia substituir a loiça reutilizável em comboios, para evitar a propagação da tuberculose.
A década de 30, vê surgir o 1º. polímero sintetizado em laboratório, o polietileno (usado hoje em dia para o fabrico de sacos de plástico, por exemplo), o acrílico (plexiglass) e o nylon, que introduz o plástico na indústria da moda.
Entre as duas Grandes Guerras, o benzeno era a matéria-prima mais utilizada para a produção de polímeros, extraído e refinado quase exclusivamente do carvão. Mas é também neste período que lentamente a indústria do plástico começa a sua migração para a dependência do petróleo como matéria-prima. No período em que durou a II Guerra Mundial, a escassez de recursos naturais conduziu a um número impressionante de inovações químicas e sintéticas muito importantes para a vitória militar. Era a partir do nylon, por exemplo, que se fabricavam paraquedas, cordas, forros para capacetes, entre outros artigos.
Após a II Guerra Mundial, os fabricantes de plástico dedicaram-se, então, a fabricar produtos de consumo em larga escala, modificando os moldes utilizados anteriormente para os produtos da Guerra. A produção de sintéticos aumentou exponencialmente e a procura por carvão e benzeno cresceu como nunca, deixando os fornecedores impotentes para a acompanhar.
Nos anos 50 o governo dos EUA decidiu intervir nesta questão atribuindo generosos subsídios a empresas como a Standard Oil no sentido de se construírem mais fábricas de benzeno derivado de petróleo. Foi nesta altura que surgiram o polyester e o polipropileno, por exemplo, assim como as famosas reuniões Tupperware que, subtilmente, ajudaram a introduzir o plástico na vida do dia-a-dia. Nesta altura, a produção de plástico cresceu mais de 15%, quase o quádruplo da do aço e em 1960 o plástico era uma das maiores indústrias mundiais.
Entre 1960 e 1980, o plástico ocupa a arte e a estética, sendo um dos protagonistas do movimento modernista a nível global. Aa corrida espacial entre os EUA e a União Soviética, tornou-se possível graças à sua leveza, resistência e durabilidade. As linhas de produção de plástico à base de petróleo forneciam uma fonte inesgotável de objectos essenciais à vida do dia-a-dia que iam desde os móveis aos brinquedos, embalagens para roupa e muito, muito mais.
A primeira garrafa descartável de refrigerantes de polietileno tereftalato (PET) foi introduzida no mercado em 1975 e veio ilustrar o desperdício irracional do sistema de produção massivo. Hoje omnipresente, a garrafa PET facilitou a mudança da indústria de vidro reutilizável para os recipientes descartáveis.
Foi na década de 60 que se observaram, pela primeira vez, resíduos de plástico nos oceanos e, nos anos 70, o movimento ambientalista emergente deu início à tomada de consciência para a toxicidade e desperdício dos produtos sintéticos, os quais, na sua grande maioria, eram pensados para ser descartáveis. Nos anos 80, a reputação do plástico descartável começou a ser posta em causa devido à sua durabilidade e invasão agressiva do meio ambiente. Nasceram as campanhas “Reduzir – Reutilizar – Reciclar” e a indústria do plástico ofereceu pela 1ª vez a solução da reciclagem, incentivando a recolha e processamento do plástico nos sistemas de tratamento de resíduos. Uma solução que provou ter resultados muito fracos, já que nem todos os tipos de plástico podem ser reciclados. Em 1988 foram introduzidos os símbolos de reciclagem triangulares, relacionados com a qualidade dos plásticos, tendo sido assegurado ao consumidor que podia continuar a comprar e descartar plástico, desde que depois de utilizá-lo o colocasse nos locais indicados para reciclagem.
Todas estas iniciativas, sabemos hoje, foram essencialmente enganosas. Não existiam na altura (nem existem actualmente) infraestruturas suficientes para reciclar todo ou a maior parte do plástico consumido e, embora se pensasse que o lixo plástico estava a ser reciclado, a maior parte dele estava a ser queimada, enviada para aterros sanitários ou para países pobres que acabavam por despejá-lo nos oceanos. Exactamente como se continua a fazer agora, no século XXI.
Nos anos 90, o plástico passou a ser utilizado em quase todo o tipo de indústrias, tais como a automóvel, a da saúde e a da alimentação e vários estudos indicam que terá sido nesta altura que se verificou um exponencial aumento de resíduos de plástico nos oceanos do nosso planeta.
Do ano 2000 em diante, a produção e o lixo plástico aumentaram dez vezes mais em relação às cinco décadas anteriores.
Embora continuem a surgir importantes iniciativas e tecnologia para substituir, travar e reciclar o plástico, continuamos a viver, em pleno século XXI, dominados por este produto e pela dependência da sua matéria-prima vital, o petróleo.
O plástico de uso único é um claro exemplo dos problemas causados pela nossa cultura de consumo e descarte. Em vez de investirmos em produtos de qualidade e duradouros, somos empurrados para uma priorização da conveniência, do que é mais fácil e mais barato, sem considerarmos a durabilidade dos produtos e os seus impactos a longo prazo. É esta cultura que nos faz acumular resíduos a uma escala imensa e que nos fez chegar à actual e dramática situação ambiental.
O lixo plástico gerado nas cidades é apenas o 1º nível da nascente de resíduos que entra todos os dias nos cursos de água e nos oceanos de todo o mundo, onde chegam todos os anos, uns impressionantes 8 milhões de toneladas de resíduos. A maior parte são plásticos de uso único, oriundo de países que carecem de infraestruturas de tratamento de lixo e reciclagem, particularmente na Ásia e na África. Curiosamente, é para alguns destes países, desprovidos de infraestruturas e de meios, que os Estados Unidos e alguns países membros da União Europeia enviam o seu lixo plástico para ser tratado ou reciclado.
Existem comunidades costeiras no Sudoeste Asiático literalmente enterradas sob milhares de toneladas de plástico. E ali não são só as praias que estão destruídas… quando o lixo plástico é incinerado, os fumos tóxicos rapidamente se tornam num perigo para a saúde dos residentes. Esta é uma das mais graves consequências da crise ambiental: os seus piores efeitos são empurrados para as comunidades que têm menos recursos para lutar contra eles.
É, no entanto, a vida selvagem no seu habitat natural, quem tem que carregar o maior fardo deste influxo de lixo, sendo os animais marinhos os mais fustigados. 90% das aves marinhas encontradas sem vida tinham plástico nas suas entranhas e 100% das tartarugas marinhas também. Como é do conhecimento geral, os cientistas estimam que em 2050 haverá nos oceanos mais plástico do que peixes.
A produção do plástico contribui para emissões de gases de efeito de estufa em todos os pontos do seu ciclo de vida. O processo de perfuração da terra para extração das suas matérias-primas, petróleo e gás, leva a vazamentos e queimas de metano que geralmente são combinadas com a destruição de florestas. As refinarias onde o petróleo em bruto é transformado em plástico constituem uma das indústrias que mais liberta gases de efeito de estufa.
É importante e urgente livrar o nosso planeta dos impactos causados pelo lixo plástico. Para nos direccionarmos para um futuro mais sustentável, devemos estar conscientes, em todos os momentos, dos nossos padrões de consumo e flexíveis para alterá-los se assim for necessário. Utilizar menos plástico, optar por serviços onde ele não exista, reutilizar ou aproveitar as alternativas já existentes no mercado são meios eficazes para deter o desperdício plástico e as graves consequências ligadas à sua produção e consumo. É importante também que a indústria e os governos continuem a investir em tecnologia que permita produzir novos materiais que substituam o plástico e que o reciclem mais eficazmente. O plástico continuará a existir em função da existência e disponibilidade de alternativas sustentáveis.
O plástico sobrecarrega os sistemas de gestão de resíduos, os oceanos e as comunidades mais vulneráveis em todo o mundo. Felizmente uma onda de proibições ao consumo de plásticos de uso único começa a estender-se a todos os países. Palhinhas, sacos, agitadores de bebidas e embalagens de take away, por exemplo, têm sido dos primeiros produtos a ser proibidos em todo o mundo. A 1 de Novembro de 2021, a União Europeia pôs em marcha a Directiva (EU) 2019/904, que obriga os seus estados-membros a prevenir e reduzir gradualmente o plástico de uso único.
Estas medidas proibitivas evitam que todos os anos entrem no fluxo de resíduos mais milhares de toneladas de plástico e, quando se trata de resíduos que duram para sempre, cada tonelada que for evitada, importa.
A proibição do plástico descartável não reduz apenas o seu consumo e utilização, reduz também a sua produção, um dos principais factores responsáveis pelas alterações climáticas. Para além destes impactos, existem também os impactos sociais e culturais que advêm da proibição do plástico. As empresas são forçadas a inovar e a repensar os seus projectos, através da compra e produção de materiais sustentáveis. Estes novos produtos ajudam a mudar a mentalidade do consumidor e a reconhecer que o desperdício e o descarte não são sustentáveis.
Até as boas intenções e a legislação serem uma realidade, as nossas escolhas individuais – e as mudanças colectivas que a elas conduzem – são sentidas rapidamente e com um impacto quase imediato no meio ambiente. Actos tão simples como comprar uma garrafa de água reutilizável pode poupar o ambiente de centenas de garrafas de plástico por ano. Usar um saco reutilizável para as suas compras ou questionar serviços que lhe ofereçam plástico por uma alternativa, são iniciativas muito importantes para erradicar o plástico de uso único da sua vida e proteger o nosso planeta dos impactos do lixo plástico.
Fontes:
https://www.worldenvironmentday.global
#BeatPlasticPollution This World Environment Day (unep.org)
Plásticos de Utilização Única | Agência Portuguesa do Ambiente (apambiente.pt)
https://www.bbc.com/news/magazine-27442625
The Story of Plastic: How Plastic has Changed the World (virtuebrush.com)
https://fenix.ciencias.ulisboa.pt/
History and Future of Plastics | Science History Institute